10 de junho de 2020

Santa Inês / Por que a Justiça determinou a suspensão do seletivo da saúde?


A Prefeitura de Santa Inês, em obediência à decisão judicial oriunda do Processo nº 0800744-37.2020.8.10.0056, da 1ª Vara da Comarca de Santa Inês – MA, revogou, por meio do Decreto nº 34, de 03 de junho de 2020, disponibilizado no Portal da Transparência, o Processo Seletivo que era destinado à contratação de profissionais da saúde para o combate ao Covid-19.

Mas, o que motivou a decisão judicial? Pois bem, confiram abaixo a transcrição de parte da decisão da juíza Denise Cysneiro Milhomem, da Comarca de Santa Inês, com trechos da denúncia oferecida pelo Ministério Público.

O texto completo da decisão (que é de acesso público) pode ser conferido no PJe (https://pje.tjma.jus.br/pje/ConsultaPublica/listView.seam) com o número do processo: 0800744-37.2020.8.10.0056


AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL
ACPCiv 0800744-37.2020.8.10.0056 - Obrigação de Fazer / Não Fazer 
Ministério Público do Estado do Maranhão X MUNICIPIO DE SANTA INES

DECISÃO

(...) Em síntese, narra o Ministério Público Estadual que o Município de Santa Inês suspendeu o concurso público regido pelo edital 001/2019, através do edital n.º 001-028/2020 e, posteriormente, manteve a suspensão, atendendo recomendação do órgão, através do edital n.º 001-029/2020 sob a justificativa da pandemia, no dia 06 de abril de 2020, quando a próxima etapa seria a de títulos.

Relata ainda a representante do Ministério Público os procedimentos tomados no âmbito administrativo daquela Promotoria de Justiça de forma extensiva.

Informa que o Município de Santa Inês encaminhou o projeto de lei nº 004 e 005/2020, a Câmara de Vereadores de Santa Inês, convertendo-os nas Leis Municipais n.º 630/2020 e 631/2020, que tratam da criação de cargos, vagas e salários no quadro de pessoal temporário da Prefeitura Municipal de Santa Inês, somente para o enfrentamento da pandemia COVID-19, para atender as necessidades extraordinárias de combate ao coronavírus, bem como autoriza a realização de Seletivo para provimento dessas vagas e dá outras providências.

Afirma que os cargos que se visam preencher mediante contratações temporárias (Lei Municipal nº 631/2020) são cargos previstos no edital nº 001/2019, a exceção do cargo de médico anestesista, de modo que uma contratação temporária no momento, viola os princípios da legalidade, impessoalidade e eficiência.

Afirma também que a Lei Municipal nº 630/2020 padece de inconstitucionalidade, pois não se vislumbra a possibilidade de criação, no quadro de pessoal temporário da Prefeitura Municipal de Santa Inês, de cargos, vagas e salários, eis que, embora, em casos excepcionais e constitucionalmente previstos, haja a possibilidade de se preencher os cargos permanentes já existentes no âmbito da administração pública por meio de contratações temporárias, não existe “quadro de pessoal temporário”.

Requer Tutela Provisória de Urgência Antecipada, para suspender parcialmente o processo simplificado, edital de nº 001/2020, com prosseguimento apenas em relação ao cargo médico de anestesista, conforme número de vagas já existente na administração pública; continuidade do concurso público regido pelo edital n. 001/2010, de forma célere, diante da urgência e previsão de que a entrega dos documentos, pelos concursados, necessários para as fases subsequentes, seja feito tanto em caráter físico quanto eletrônico, com declaração de autenticidade.

Ao final, pede a procedência do pedido para condenar o requerido em obrigação de não fazer, a fim de suspender o processo seletivo simplificado parcialmente e dar prosseguimento ao concurso público.

Acostado a inicial ministerial, procedimento administrativo deste órgão, registrado sob o n.º 000489-509/2020, incluso edital de convocação para prova de títulos às fls. 24/41, conforme id. nº 31234165; projeto de lei n.º 04/2020 e n.º 05/2020, respectivamente às fls. 12/15 e 17/19, Lei Municipal de n.º 630/2020 e 631/2020, correspondendo cada as fls. 45/46 e 50/52, do id. n.º 31234831; decreto municipal n.º 13/2020, fls. 01/07, do id. 31234832, edital do seletivo simplificado às fls. 49/66, termo de encerramento do procedimento administrativo, id. 31235195, edital de concurso n.º 001/2019, id. 31235205 e quadro de vagas do concurso, id. 31235206. 

Notificado, o Município de Santa Inês justifica a importância do processo seletivo simplificado, concomitante com o concurso público em curso, sob a égide do edital 001/2019, em razão de vários profissionais da área da saúde, que atuavam na linha de frente, terem contraído a doença no decurso da pandemia, sendo a modalidade célere e o objetivo da legislação municipal editada recentemente quanto à criação de cargos, vagas e salários no quadro de pessoal temporário da Prefeitura Municipal de Santa Inês surgiu da necessidade extraordinária de combate ao

coronavírus (COVID-19).

(...) Deduz-se do atual cenário que o processo seletivo simplificado visa o preenchimento dos cargos vagos na secretaria de saúde, por ser procedimento mais célere, em face da pandemia, porém esta contratação temporária de servidores, para cargos já existentes na Administração Pública Municipal e vagos, fere a legislação maior do País, por não permitir a ocupação de cargos previstos em lei, por tal procedimento simplificado, os quais somente devem ser preenchidos mediante concurso como determina o art. 37, inc. II, da CF.

O preenchimento do quadro de pessoal permanente da administração pública na área da saúde ataca princípios basilares da administração pública, como da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência e traz prejuízos diante da qualidade profissional do servidor público ocupante de cargo efetivo por concurso público e da quebra da continuidade do serviço se realizado por servidor eventual.

Assim, somente pode ser objeto do procedimento seletivo função pública que não esteja contemplada em cargo no presente edital de concurso público, que, no caso, vislumbra-se momentaneamente o de médico anestesista.

É muito importante ressaltar que o Município de Santa Inês pode realizar procedimento seletivo para área da saúde, em razão da pandemia, porém, para fazê-lo, deve demonstrar a carência da função, com o fito de preenchimento, por servidor transitoriamente, fora do quadro de servidores permanentes, por motivo de emergência, conforme citação suso do mestre Hely Lopes Meirelles, como exemplo, seja pelo elevando índice de licenças médicas dos concursados e alto índice de pacientes contaminados pelo coronavirus, extrapolando a capacidade de atendimento da rede municipal de saúde, ou para exercerem funções em hospitais de campanha, com documentação administrativa probatória.

Em função do exposto, com base no art. 300, do CPC, concedo a tutela provisória de urgência antecipada para que o Município de Santa Inês, no prazo de 24 horas, da data da intimação: a) suspenda a lei municipal n.º 630/2020, por não se coadunar com o art. 37, inc. II, da CF; b) suspenda parcialmente a lei municipal n.º 631/2020, a fim de permitir somente o prosseguimento do procedimento seletivo em relação a função pública transitória, de médico anestesista e/ou de outra função pública transitória necessária, diante da excepcionalidade, para preenchimento de licenças médicas de servidores da área da saúde que atuem diretamente no combate da pandemia, no prazo destas, desde que não abrangidas por cargos públicos existentes, comprovada documentalmente administrativamente, com envio de cópia ao MP, consoante art. 37, inc. IX, da CF e c) prossiga o concurso público regido sob o edital 001/2020, consoante, art.37, inc. II da CF. 

Aplicar-se-á multa diária, se descumprida a ordem judicial, no prazo estipulado, ao Município réu, no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), não podendo ultrapassar o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser revertido a fundo municipal de saúde e ao Gestor Municipal multa, com base no art. 77, inc. IV, § 1º, do CPC, no valor de 20% (vinte por cento) sobre a causa.

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